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O cerco as ideias - por Flavio Siqueira
28/02/2020 17:03 em Textos

O cerco as idéias é um recurso de dominação.

 

 
Uma ideia sem proteção é naturalmente revolucionária, como uma árvore que se expande até as raízes destruírem as cercas.
 
Coloca-se cercas no entorno de idéias. Elas, as idéias, estão lá, mas nitidamente reduzidas aos limites da estética, da moral e do aceitável por determinadas médias. As grandes árvores viraram bolsais, totalmente sob controle.
 
Trata-se de uma questão da liberdade.
 
É no campo das idéias que os homens semeiam a própria liberdade, pois apenas a partir do pensamento livre poderemos superar nossa evidente mediocridade animal.
 
As artes, a ciência, a filosofia, as manifestações de espiritualidade, desde que abertas ao mistério, carregam em si componentes incontroláveis, pois estão diretamente ligadas ao desejo de transcendência humana. Esse desejo é o que carregamos de mais poderoso e, a partir dele, tudo o que criamos como sociedade (para o bem e para o mal) passou a existir.
 
Mas temos medo da liberdade e necessidade de controle.  Tentamos determinar o que é arte e sobre ela colocamos um preço, domesticamos a ciência nos corredores da academia que nos “formam” e os saberes como posse dos intelectuais, a própria filosofia se reduziu a repetição atenuada (e embalada para consumo) do que pensadores do passado disseram. Uma cadeira apenas.
 
Na espiritualidade temos um poderoso exemplo:

 

 
A ideia de deus, sempre presente na humanidade (em várias formas) foi circunscrita ao “design” judaico/cristão (e seus derivados). Ideia potencialmente selvagem, domesticada, moralizada e sufocada em uma serie de dogmas e rituais, com direito a punições e benefícios aos que crerem ou deixarem de crer.
 
A fé deixou de ser um estado de busca e passou a ser uma condição de medo.
 
Deus tornou-se uma marca e os que falam em nome dela proprietários de milenares industrias. Manipulam o que não se pode manipular a apropriam-se do mais poderoso anseio humano, fonte de toda aspiração filosófica, ligado as mais profundas questões existenciais.
 
Sem perceber aceitamos elaborar para consumo e controle, manifestações legitimas de anseio à liberdade articuladas por questões práticas ligadas ao racismo e o direito de minorias,
 
A maneira como grupos políticos criam uma estética própria e se apropriam dos temas, estabelece uma cerca por onde as questões mais estruturantes não passam. Novamente as árvores selvagens viraram bonsais.
 
Reduzem os clamores por liberdade a bordões e transformam a luta humana em poder para si mesmos. Perde-se a habilidade de pensar por si próprio até que só haja o pensamento de massa, manipulado pelos grandes líderes.
 
Ideias minguadas até estarem prontas para serem consumidas.
 
Marcas (artistas, partidos políticos, militâncias) viram o simbolo de algo que pode passar pelas causas ligadas objetivamente aos discursos, mas que no fundo apontam para algo maior e presente em toda humanidade : o desejo de liberdade.
 
Na medida em que as gerações se sucedem renovamos a estética dos discursos, os focos acompanham as realidades de cada tempo, mas me parece que o pano de fundo de nossas questões permanece imutável: Vivemos a perplexidade de seres que percebem-se finitos ao mesmo tempo em que se sentem portadores de algo atemporal.
 
Desejamos transcender o casulo do corpo e das ideias e há milhares de anos desenvolvemos linguagens que em parte possam ilustrar e, quem sabe, nos oferecer algum conforto.
 
Nossa busca começa no seio da mãe, passa pelos amores, pelas paixões, pelos nossos vazios que não se cansam de buscar algum sentido.
 
O horizonte que nunca chega, mas que nos estimula a sempre caminhar.
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